Senador Marco Maciel

A Organização das Nações Unidas, que reúne 192 países, instituiu 15 de setembro como Dia Internacional da Democracia. Trata-se de atitude coerente com as origens da instituição e, por isso, o atual secretário-geral, Ban Ki-moon, pode dizer que sistemas democráticos são essenciais para se alcançar os objetivos de paz, direitos humanos e desenvolvimento no mundo. No Ocidente, todos esses conceitos tiveram início com o célebre discurso de Péricles, em Atenas, três séculos antes de Cristo. Nele o orador apresentava os elementos fundamentais da democracia: governo não de poucos, mas da maioria . E explicava o seu sentido ético: Não é o fato de pertencer a uma classe, mas o mérito, que dá acesso aos postos mais honrosos; inversamente, a pobreza não é razão para que alguém, sendo capaz de prestar serviços à cidade, seja impedido de fazê-lo pela obscuridade de sua condição .

E, para acentuar o pressuposto de que sem moralidade não se pode fazer democracia, explicava o estratego e político grego: No tocante às leis, todos são iguais para a solução de suas divergências privadas. (…) Ao mesmo tempo que evitamos ofender os outros em nosso convívio privado, em nossa vida pública nos afastamos da ilegalidade principalmente por causa de um temor reverente, pois somos submissos às autoridades e às leis, especialmente àquelas promulgadas para socorrer os oprimidos e às que, embora não escritas, trazem aos transgressores uma desonra visível a todos .

Já Robert Dahl, num de seus livros, afirma: A democracia não é uma fórmula particular de sociedade ou uma concreta forma de vida, mas sim um tipo específico de procedimento ou de técnica, em que a ordem social é criada e aplicada pelos que estão sujeitos a essa mesma ordem, para assegurar a liberdade política, entendida como autodeterminação .

Daí, podemos concluir que a democracia, como puro procedimento, carece de um conteúdo substancial: não garante que as normas de ordem social tenham de ser justas ou equitativas, que expressem o interesse comum; assegura, tão somente, que todos quantos vivem sob sua sujeição tenham participado de sua criação.

Ademais, os conceitos elaborados pelo jurista Hans Kelsen nos levam, necessariamente, à distinção entre democracia representativa e democracia participativa. A teoria da representação é calcada na premissa de que os que tomam as decisões na democracia representativa são os representantes livremente escolhidos pelos eleitores. A eles cabe aprovar as leis que organizam a sociedade e o poder. Por seu turno, a democracia participativa significa um passo adiante: os representantes não apenas aprovam as leis. Devem votá-las, desde que atendam aos requisitos de justiça e equidade e exprimam o interesse comum.

Considerado sob esse aspecto, o fundamento ético de representação política e seu papel insubstituível consiste na necessidade de enfrentar e superar as novas demandas sociais. Quando isso não ocorre, o resultado é o surgimento de crises que se sucedem sem que, muitas vezes, saibamos qual sua causa.

Do tempo de Péricles aos atuais, o conteúdo da democracia foi sendo enriquecido pelas experiências históricas dos povos. Assim, a Constituição é a suprema formalização da democracia que, nos novos tempos, incorpora uma espessa declaração de direitos sociais e econômicos. As modernas cartas magnas, como a brasileira de 1988, acrescentam o reconhecimento de outras conquistas de direitos e deveres inclusive no campo dos direitos humanos e da preservação do meio ambiente. Mais do que nunca, o mundo necessita expandir, por toda parte, os valores da democracia verdadeira, autêntica. Democracia social, fundada na ética, com participação e igualmente atenta ao território da cultura, pois nele estão alojados os valores que definem a identidade dos diferentes povos e nações.

Marco Maciel é Senador (DEM-PE) e membro da Academia Brasileira de Letras (ABL)